“Ó Pai, Ó” – Crítica

Lázaro Ramos lidera um elenco cheio de talentos baianos que traz cultura negra, malemolência e carnaval em uma crônica urbana que conquistou o Brasil em um dos maiores sucessos nacionais dos anos 2000.

Fonte: Globo Filmes

O Brasil é um caldeirão cultural riquíssimo cheio de diversidade de cores, sotaques e costumes, de norte a sul é difícil não encontrar novidades, se encantar com pessoas e se maravilhar com o nosso chamado regionalismo, que dá cara a um povo humilde, mas cheio de riqueza e eterno amor pelos seus costumes e pelo lugar onde vivem.

É seguindo esta linha que venho na coluna “Nostalgia Preta” falar de um dos filmes nacionais mais populares da década de 2010, “Ó Pai, Ó” (2007) da Globo Filmes distribuído pela Europa Filmes, longa dirigido por Monique Gardenberg (Benjamin) e protagonizado por Lázaro Ramos (Madame Satã, Meu Tio Matou Um Cara) que faz parte de um grupo de inquilinos de uma casa de aluguel degradada que tentam levar a vida usando criatividade, ironia, humor e música para sobreviver os perrengues do dia-a-dia durante o período do carnaval tendo como o palco o histórico Pelourinho.

O longa é uma crônica urbana cheia de entusiasmo que traz no seu roteiro primariamente o povo como foco, não necessariamente possui um objetivo narrativo a ser atingido, mas sim um desenvolvimento que procura aprofundar na baianidade de uma comunidade majoritariamente negra que enfrenta a mesma dificuldade do restante do país que ainda é marcado pela desigualdade, racismo e divisão de classes.

Fonte: Globo Filmes

A forma como “Ó Pai, Ó” explora todas essas vertentes é através do humor, basicamente o cerne de uma narrativa que vê nos pequenos conflitos e confusões que trazem uma leveza que é potencializada pela vontade de viver de um grupo de pessoas que precisam matar um leão por dia, mas mantém o sorriso no rosto e a vontade de viver a vida, que aqui é representada por Roque (Lázaro Ramos) que está se preparando para o carnaval enquanto sua vida está desmoronando ao redor.

Talvez o que tenha feito o filme ter ficado tão popular, seja a forma como trabalha a dinâmica entre os personagens, todos com bastante personalidade dando a vida ao tal prédio onde se passa a história. É através da história de Dona Joana (Luciana Souza), Professora (Jamile Alves), Neuzão da Rocha (Tânia Toko), Peixe Frito (Cidnei Aragão), Psilene (Dira Paes), Yolanda (Lyu Arisson), Dalva (Merry Batista), Reginaldo (Érico Brás), Lúcia (Edvana Carvalho), Rosa (Emanuelle Araújo) e Boca (Wagner Moura) que embarcamos numa jornada cultural bastante divertida.

O longa é maravilhoso na forma como abraça suas qualidades, o humor encaixa muito bem e ter pessoas baianas na frente e atrás da câmera torna tudo mais autêntico, fazendo da narrativa algo que se não move muito em termos de história, mas ao menos proporciona momentos de crítica sociais muito pontuais, inclusive na forma como trata questões raciais, inclusive em uma cena específica entre os personagens dos atores e amigos da vida real Lázaro Ramos e Wagner Moura é uma das sequências mais memoráveis da obra, lembrada toda vez que referenciamos diálogos fortes sobre combate ao racismo.

Fonte: Globo Filmes

Em “Ó Pai, Ó”, temos ainda o retrato de uma Bahia preta incrível, ambientada num Pelourinho que visualmente e culturalmente é magnifico ganhando toques dos batuques e atabaques de grupos como Olodum que ajudaram a levar este estado a ser conhecido mundialmente. O longa ainda aproveita sua fotografia solar com uma direção que faz pulsar imagens dos corpos maravilhosos e alegria contagiante que reverberam a cada frame do filme.

É claro que se a primeira metade do filme é competente em apresentar esse universo tão rico descrito anteriormente, a segunda metade acaba perdendo um pouco de foco ao trazer drama para terceiro ato, onde o lado lúdico, ensolarado e alegre, dá lugar em meio as comemorações há perigos a espreita em um desfecho trágico que acaba destoando do resto do filme. A sequência final talvez seja a mais emblemática que já testemunhamos ao som de “Protesto” do Olodum com os maiores nomes da música baiana como Margareth Menezes, Araketu, Daniela Mercury cantando a uma só voz, sendo também um dos momentos mais triste e marcantes da narrativa servindo como chamado social a realidade violenta de Salvador.

A atuação forte de Lázaro Ramos puxa o bonde de atores que merecem todo destaque do mundo por fazer “Ó Pai, Ó” o que ele é hoje, uma nostalgia boa de ser relembrada. A maioria dos talentos vindos do teatro baiano e alguns globais como Stênio Garcia se destacam pelo humor e por conseguirem dar cara e características a um povo que sabe aproveitar o mínimo sempre olhando o copo mais cheio, mesmo com as dificuldades que se apresentam, tudo isso muito bem conduzido pela direção de Monique Gardenberg.

Fonte: Globo Filmes

No final das contas, “Ó Pai, Ó” continua sendo um bom filme, talvez não consiga equilibrar tão bem drama e humor, as vezes até fica datado demais afinal são 16 anos desde sua estreia, mas em termos de apelo cultural, música e carisma de personagens, o longa se destaca de uma forma muito positiva, além de conseguir através dos exageros escancarar através de críticas sociais tocando em assuntos que fazem parte da realidade baiana como racismo, prostituição, turismo sexual e outras violências sofridas por um povo que luta por mais respeito e igualdade, mas que nunca perdem a paixão e o amor a vida, sendo retratado aqui de uma forma bastante autêntica e emocionante.

Obs: “Ó Pai, Ó” obteve tanta popularidade que ganhou um seriado em 2008 com duas temporadas sendo encerrado em 2009. A sequência do filme de 2007 está programada para dia 23 de novembro deste ano.

Gostou? Veja o trailer abaixo e comente sobre o filme.

Um comentário sobre ““Ó Pai, Ó” – Crítica

Deixe um comentário