“Respect – A História de Aretha Franklin” – Crítica

Um dos filmes mais esperados da temporada de premiações acaba sucumbindo a sua própria ambição ao tentar fazer jus a biografia da grande Aretha Franklin, mesmo com um esforço notável de Jennifer Hudson no papel principal.

Fonte: MGM Studios

Contar a história de uma pessoa é difícil, e se ela for de um artista consagrado que marcou uma geração e várias décadas, o trabalho se torna ainda mais desafiador para um diretor e um roteirista conseguir comprimir toda essa trajetória de sucesso numa narrativa de quase duas horas de duração. Ano passado comentei sobre a biografia “Estados Unidos Vs Billie Holiday” que tentou contar a história de um ícone norte americano que marcou a história da música nos EUA, mas acabou tendo um resultado aquém do esperado, exatamente por tentar contar muita coisa num curto espaço de tempo, isso infelizmente se repete nesta biografia que conta a trajetória da grande Aretha Franklin.

O longa dirigido pela diretora Liesl Tommy (Insecure), “Respect – A História de Aretha Franklin” (Respect, 2021), esta produção da MGM era para ter estreado no final de 2020, mas devido a pandemia foi adiado para Agosto de 2021, sempre cercado de grandes expectativas, não só por contar a história da Rainha do Soul e uma das vozes mais marcantes de todos os tempos, mas por ter um elenco a altura de uma produção deste tipo tendo a ganhadora do Oscar, a atriz e cantora Jennifer Hudson (Dreamgirls) como protagonista no papel da senhora Franklin.

O filme começa contando a história de Aretha desde sua infância no período de 1952, mostrando seu relacionamento com o pastor e pai C.L. Franklin (Forest Whitaker) vivendo num bairro modesto em Detroit no Michigan onde vivia com seus irmãos. No fim de semana passava com a mãe Barbara (Audra McDonald), já que os pais estavam separados nesta época.

Fonte: MGM Studios

O roteiro escrito por Tracey Scott Wilson (The Americans) tenta mostrar a infância turbulenta de Aretha, ao mesmo tempo que revela o talento único da futura estrela que tinha um dom especial para o canto desde criança, sempre roubando a cena nas festas adultas do pai trazendo a atenção para si com um potencial vocal que causava espanto pela pouca idade, atraindo olhares de muitos, incluindo homens de má fé.

Talvez “Respect” tenha um dos primeiros atos mais problemáticos que já vi atualmente em biografias, porque demora a engatar, a direção de Liesl ainda busca o tom certo enquanto a história vai seguindo, sendo assim perdemos momentos importantes que praticamente definiriam a vida de Aretha mesmo após ela se tornar uma cantora consagrada. Os traumas e abusos que a personagem sofre desde pequena são tratados de forma pouco profundas onde o roteiro peca por não desenvolver isso com mais cuidado, afinal acaba por ser algo que Franklin carrega consigo e acaba definindo muito de sua carreira e das escolhas equivocadas que faz em relação aos parceiros que se envolve.

Por outro lado, acredito que o roteiro consegue dar uma ênfase certa a como o sistema patriarcal reprimia as mulheres de forma sufocante nos anos 50 e 60 e as impedia de fazer algo ou atingir seu potencial. A trajetória de Aretha foi marcada por obstáculos, seja pela mão pesada do pai que queria controlar sua carreira, seja pelo primeiro marido Ted White (Marlon Wayans) que assumiu o lugar do pai ajudando a catapultar sua carreira.

Fonte: MGM Studios

Na minha visão, o filme só consegue parar de oscilar mesmo depois quase uma hora de duração, quando a trama foca na trajetória vencedora de Aretha em busca de hits que acabaram por definir sua carreira. Neste ponto a direção de Liesl finalmente decola quando foca em momentos maravilhosos como a linda sequência da composição de “Ain’t No Way”, onde Hudson brilha com um potencial vocal incrível e onde a personagem consegue gerar comoção pelo talento testemunhado por aqueles a sua volta.

Muito de “Respect” funciona, devido ao esforço de Jennifer Hudson no papel de Aretha. Se atriz peca por não trazer uma composição física próxima ao visual da rainha do soul, ela compensa isso com a voz cantando os sucessos de Franklin com um afinco admirável, destacamos aqui a performance de “(You Make Me Feel Like) A Natural Woman” e o maior hit de Aretha, a icônica “Respect” (que dá nome ao filme e funciona como um grito de liberdade para ela). Hudson também consegue capturar alguns trejeitos de Aretha e na minha visão consegue passar a vulnerabilidade da cantora, além de como ela internaliza seus traumas passados e vícios com bebidas que acabaram por ser um problema durante os anos 70.

O roteiro talvez devesse ter focado apenas numa época da vida de Aretha, pois ao abraçar quase três décadas da jornada da cantora, o filme acaba ficando inchado, passando muito rápido por momentos onde a história poderia ganhar em carga dramática, até mesmo em períodos onde o ativismo da cantora aflora na luta dos direitos humanos onde acaba por conviver com figuras como Martin Luther King Jr e se inspirar em outras como Ângela Davis, mas que aqui acaba se desenvolvendo de forma superficial, acertando apenas na parte musical da trama, mas pecando por não explorar melhor também o lado humano da cantora e sua relação com filhos, por exemplo, ou até mesmo com as irmãs, que acabam fazendo parte da sua equipe quando ela atinge o auge.

Fonte: MGM Studios

Em termos de produção, a obra ao menos possui uma boa ambientação, belos figurinos, boa maquiagem e a fotografia só começa a fica melhor na segunda metade durante as apresentações da cantora, onde também a edição começa a trabalhar de forma enriquecer a jornada biográfica de Aretha. Em relação ao elenco, além de Hudson, o destaque vai para Forest Whitaker (O Último Rei da Escócia), Audra McDonald (The Good Fight) e Marlon Wayans (Todo Mundo Em Pânico), ainda temos Tituss Burgess (Meu Nome É Dolemite), Tate Donovan (Argo) e a cantora Mary J. Blige (Mudbound – Lágrimas do Mississippi) fazendo participação especial como Dinah Washington, uma das cantoras negras que serviram de inspiração para a carreira de Aretha.

No geral “Respect – A História de Aretha Franklin” é uma biografia que poderia render muito mais se diminuísse o escopo da própria ambição e focasse numa época só da trajetória de Aretha, uma cantora marcante e considerada uma das vozes mais marcantes da indústria da música de todos os tempos. É claro que o longa não é um total desperdício, ainda possui momentos bons, principalmente ligado ao seu lado musical, quando vemos Aretha crescendo como cantora e despontando para uma carreira meteórica e consagrada, achando sua própria voz e sabendo dizer basta aos abusos que sofreu durante a vida. Com uma boa atuação de Jennifer Hudson e apesar de ser um pouco longo demais, esta obra vale para conhecer melhor a cantora, mas no final das contas, fica a impressão de o filme poderia ser melhor e com certeza um tributo mais honroso, afinal, Aretha Franklin é grande demais para receber algo menos do que épico.

Gostou? Veja o trailer abaixo. Se já conferiu este filme, comente também e diga o que achou.

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