“Sintonia” – 4° Temporada – Crítica

O fim de uma saga? Com clima de despedida, a série nacional da Netflix chega ao seu quarto ano recheada de muitos dramas, ótimos desenvolvimentos e desfechos esperados numa série que é atualmente uma das melhores séries brasileiras.

Spoilers Pesados Abaixo

Fonte: Netflix

Depois de um terceiro ano eletrizante e um gancho espetacular servindo como ponto definição do trio protagonista, o seriado brasileiro “Sintonia” retorna para seu quarto ano cercado de expectativas de uma temporada que prometia não só subir o nível da adrenalina, mas também por apontar as consequências principalmente em relação a Nando (Christian Malheiros) ao tentar largar a vida de crime se tornando alvo da própria organização colocando sua esposa e seus amigos Doni (Jotapê) e Rita (Bruna Mascarenhas) em risco.

É raro uma série chegar aquecida a um quarto ou quinto ano, mas esta produção da Netflix conseguiu um feito de se manter relevante dentro do catálogo conquistando fãs e se tornando uma das melhores séries atuais. A quarta temporada começa segundos depois do gancho da temporada anterior com Nando e Scheyla (Julia Yamaguchi) inaugurando uma cafeteria recebendo os amigos, mas acabam no meio de um confronto entre traficantes e polícia num plano muito bem armado.

O arco desta temporada é sobre consequências e mais uma vez um teste para o trio protagonista lidar com o efeito de suas ações. Entrando um pouco no campo dos spoilers, se você não assistiu ainda, sugiro que pare por aqui. Ok, o episódio inicial “Salva Meu Irmão” (4×01), é eletrizante em todos os aspectos, Doni é baleado, Scheyla é presa, Nando escapa e se isola fora do Brasil, Rita tem que lidar com amigo ferido e outro foragido, gerando um potencial enorme para ser desenvolvido na temporada.

Fonte: Netflix

O que se vê em “Sintonia”, é uma melhora em todos os aspectos técnicos e dramáticos com um roteiro que realmente pegou fôlego após uma consistente terceira temporada, aqui vemos uma maturidade da série criada por Guilherme Quintella, Felige Braga e Kondzilla, não só por tratar temas relevantes de uma forma bastante objetiva, como também continuar dando voz as comunidades periféricas de São Paulo.

Quando a trama se assenta em “A xerox” (4×02) e “Universidade” (4×03), a série começa a explorar três arcos e duas subtramas, o primeiro focado na recuperação de Doni após o incidente, o segundo com Rita entrando para faculdade de Direito, o terceiro com Nando tentando descobrir quem lhe traiu dentro da organização criminosa, além disso acompanharmos o drama de Scheyla na prisão feminina de segurança máxima e o drama de Clayton após conseguir a liberdade provisória lidando com a vida de ex detento.

O seriado é marcado por bons desenvolvimentos e um grande amadurecimento do seu trio principal, focando no tema central desta temporada, consequências. É através dessas resoluções que a série explora diversas temáticas do jeito que só “Sintonia” sabe fazer, com episódios bem amarrados e ganchos que acabam por prender nossa atenção do começo ao fim dos episódios.

Fonte: Netflix

Enquanto a trama de Nando continua sendo o cerne da série, as tramas de Rita e Doni finalmente conseguem o mesmo patamar de relevância principalmente da forma como são exploradas nesta temporada. Doni precisa lidar aqui não só com fisioterapia e trauma, mas também com o declínio da carreira como MC, tendo que enfrentar problemas financeiros, forçando o personagem a sair da inércia e lutar para não perder tudo que conquistou voltando as raízes como vemos no episódio “Cachorro Louco” (4×06). Isso é bacana porque dá mais espaço para Jotapê mostrar um pouco do seu lado dramático, inclusive um de seus melhores momentos é dividindo a tela com Martha Meola (O Cheiro do Ralo) no papel da sua mãe Lucrécia, finalmente a personagem teve um momento importante na narrativa.

Outra personagem que evoluiu de uma forma bastante positiva, foi a personagem de Bruna Mascarenhas, sua Rita sempre foi um espirito livre capaz de lutar por aquilo que acredita, agora encontra no caminho do Direito, a chance de lutar pelos fracos e oprimidos, fazendo assim seu arco se tornar o coração e a razão da série, servindo como voz da consciência dos amigos em momentos difíceis, principalmente Nando.

É assim que “Sintonia” cresce em qualidade, dando espaço e acreditando que atores já conhecem suficientemente seus respectivos papéis, conseguindo assim trazer mais complexidades a suas histórias, como podemos ver no episódio “Prisão Feminina” (4×04), quando vemos Scheyla encarar a dura realidade enfrentada pelas presidiárias no sistema brasileiro, mostrando a deficiência do estado em tratar e regenerar detentas, bem como dar-lhe um pouco de dignidade atrás das grades.

Fonte: Netflix

Seguindo nesse caminho, a série não só explora essa temática, mas também aproveita para colocar um embate bem interessante entre justiça e corrupção, num sistema onde o dinheiro fala mais alto, onde as maiores cadeiras que julgam são ocupadas por pessoas brancas, sem o mínimo de empatia por pessoas pretas e pobres, evidenciando o quanto nosso sistema judiciário precisa de uma reformulação, assim como um olhar para comunidades periféricas do país.

Através destas críticas sociais, o seriado mostra sua relevância em tocar em assuntos polêmicos sem hipocrisia, mas como forma de discussão, principalmente quando Rita está em tela. Por outro lado, a série ainda peca por reforçar o estereotipo do preto bandido, que precisa embarcar no crime para ter sucesso, ainda que outros personagens negros tenham destinos diferentes e índoles diferentes, nenhum deles tem a relevância de Nando na trama, tornando tudo ainda um pouco problemático quando vemos a trajetória do personagem.

Dito isso, Christian Malheiros (7 Prisioneiros) está melhor do que nunca com um personagem que só cresce, mas mantém o bom coração mesmo seguindo o instinto de tirar sua esposa da prisão e ter seus filhos junto dele custe o que custar, como podemos ver no episódio “As ideias finais” (4×05), ainda assim, ao acompanharmos seu arco de vingança atrás de um traidor, vemos ali um personagem que tem total controle do seu destino, mas que se vê num beco sem saída, mas ainda assim capaz de tirar coelhos da cartola fazendo com que o público torça para o jovem seja bem sucedido nas suas escolhas.

Fonte: Netflix

Não que esse tipo de atitude seja o correto, mas mostra que o roteiro de “Sintonia” está tão bem estruturado, que faz com o público crie empatia com personagens que deveríamos repudiar. E a série não para por aí, claramente a Netflix injetou grana, pois os aspectos técnicos continuam a apresentar um maior cuidado, seja na fotografia (as tomadas de São Paulo principalmente da Vila Aurea, estão lindas), seja na direção, passando pela montagem e terminando no ponto forte da série, a música, que inclusive se mostra ainda mais relevante ao trazer batalhas de rap e trap, além de novos rostos que ajudam a mostrar talentos escondidos na periferia.

De uma forma geral, “Sintonia” está simplesmente imperdível, uma série que está ai desde 2019 e que só fica melhor a cada temporada conseguindo de uma forma inteligente aprofundar na vida de três amigos que neste ponto criam um elo permanente com o público que os acompanhou desde o começo. A série ganha ainda mais relevância ao explorar temas importantes de cunho social e racial, além de mostrar uma periferia cheia de alma e talento sendo mostrado através de pessoas comuns e cheias de sonho.

Os dois últimos episódios “Costura” (4×07) e “A entrega” (4×08) joga a carga dramática lá em cima e entrega uma reta final eletrizante, com boas atuações principalmente de Christian Malheiros e Bruna Mascarenhas, vale o destaque também para Julia Yamaguchi que teve seu momento para bilhar também. Misturando muito drama e música, o seriado finaliza sua temporada de uma forma emocionante e excelente, resgatando momentos nostálgicos e traçando o destino desses três amigos para sempre. Mesmo que a Netflix não tenha dito nada sobre uma quinta temporada (ainda), o roteiro finaliza a trama tão bem, que poderia ser um final satisfatório para série, mas pelo bem do audiovisual nacional, acredito que “Sintonia” merece seu lugar ao sol e mais um ano para fechar com chave de ouro um dos melhores produtos nacionais da atualidade.

Gostou? Veja o trailer da quarta temporada e comente se já conferiu este novo ano.

Saiu hoje a notícia de que “Sintonia” foi renovada para quinta e última temporada. Teremos mais uma jornada antes de despedirmos dos personagens definitivamente.

foto por Helena Yoshioka

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