“Silverton: Cerco Fechado”

Qual é o preço da liberdade? Um drama baseado em fatos que foi o começo de um movimento racial na luta contra o apartheid. Mesmo necessitando de aprofundamentos em certos momentos, este filme se mostra uma decente produção sul-africana.

Fonte: Netflix

O apartheid foi um dos regimes de segregação racial mais cruéis já vistos na história da humanidade. Implementado em 1948 na África do Sul pelo pastor protestante Daniel François Malan o então primeiro ministro da época, o regime foi mantido nos governos seguintes ficando 46 anos vigente até ser derrubado em 1994 numa luta liderada por Nelson Mandela e outros aliados de forma livrar o país da violência contra o povo preto sul africano.

O começo desse estopim que levou o fim do regime iniciou-se com a libertação de Mandela da prisão, esse movimento que virou um símbolo para os sul africanos abriu os olhos do mundo para atrocidades acontecendo a população negra no país. Qual é o preço da liberdade? Um personagem cita a frase em um determinado momento do longa “Silverton: Cerco Fechado” (Silverton Siege, 2022), produção sul africana da Netflix que conta a história de um trio rebelde que luta contra o apartheid no período de 1980, mas acaba se vendo sitiada após o fracasso de uma missão de sabotagem que levou o grupo a invadir um banco e manter vários reféns.

O longa dirigido por Mandla Dube (Kalushi: The Story of Solomon Mahlangu) é um drama baseado em uma história real, confesso que não conhecia, mas ao assistir a este filme, tive a sensação que poderíamos ter mais aprofundamento da trama, ainda assim o roteiro escrito por Sabelo Mgibi carrega uma carga dramática interessante e uma tensão constante, que não se mantém o tempo todo, mas funciona na maior parte da narrativa.

Fonte: Netflix

A trama se passa basicamente no maior banco de Pretória, uma das maiores cidades da África do Sul e onde Calvin Khumalo (Thabo Rametsi) e seus companheiros Mbali Terra Mabunda (Noxolo Dlamini) e Aldo Erasmus (Stefan Erasmus) fizeram seu movimento colocando várias pessoas reféns. O grupo que queria entregar apenas uma mensagem da célula rebelde que faziam parte incentivando um ato contra o regime vigente, acabaram por entrar numa situação de vida ou morte cercados pela polícia liderada pelo comandante Johan Langerman (Arnold Vosloo). Claramente o filme carrega uma crítica social bastante forte, muito por conta do contexto onde muitos negros africanos foram massacrados até então gerando uma revolta e um engajamento de grupos rebeldes numa África do Sul dividida socialmente e dominada por uma minoria branca que causou um imenso genocídio civil.

O roteiro consegue capturar a urgência que a história pede, mas as vezes sinto falta de desenvolvimento melhor dos protagonistas, pois apesar de termos um deslumbre de suas histórias, as revelações sobre eles poderiam causar mais impacto se as motivações fossem mais claras, principalmente em relação a Calvin. O contexto do racismo, preconceito, luta de classes, colorismo, a sensação de nós contra eles é bem dosada durante o filme conseguindo criar a sensação que o inimigo está fora do banco, não dentro dele.

Gosto que “Silverton: Cerco Fechado” é um longa que começa como um falsa narrativa de roubo e se transforma em um drama social movimentado que carrega uma mensagem importante sobre liberdade do povo negro que aqui parece tímida e menor, mas que sabemos que no futuro se torna algo gigantesco que acaba por colocar toda a África do Sul unida em uma luta só.

Fonte: Netflix

É claro que o fato de a produção ser modesta é sentida em diversos momentos, mas o diretor Mandla Dube é esperto em manter as cenas mais internas focadas mais na negociação entre os sequestradores e o comandante tornando isso algo positivo que o filme consegue crescer em qualidade, onde podemos ver os riscos corridos pelo trio principal. Infelizmente em outros momentos o diretor não consegue um efeito mais pulsante quando leva aura da revolução para as sequências externas, pelo menos não em sua totalidade, não passando a sensação de algo grande rolando que irá mudar a história do país dali em diante, exemplo disso é a sequência da queima do dinheiro em uma determinada cena.

Ainda assim, o que se vê é um esforço interessante da Netflix de injetar dinheiro numa produção sul africana com peso social significante, desta forma o filme ganha uma melhora estética em relação a outras produções do continente africano. A fotografia é boa, Dube consegue tomadas interessantes dentro do banco capturando bem a emoção e o receio dos personagens, externamente apesar de não ter o mesmo peso, ao menos consegue privilegiar a arquitetura da cidade com belas tomadas ao redor do banco e mostrando a situação complicada que o grupo de sequestradores se encontra.

Em termos de atuação, a maioria é boa, talvez a melhor seja de Thabo Rametsi no papel de Calvin e Arnold Vosloo (A Múmia) no papel do comandante Johan Langerman, mas o resto do elenco não faz feio. O filme em termos narrativos consegue manter a atenção do expectador na maior parte do tempo, inserindo conflitos e tensão à medida que a história vai progredindo, gosto que a segunda metade do filme os riscos parecem mais explícitos dando ainda mais peso ao objetivo dos personagens e gerando uma chocante reviravolta perto do fim.

Fonte: Netflix

No geral, “Silverton: Cerco Fechado” é um bom filme de drama, um thriller que carrega um contexto social forte que nem sempre é bem executado, mas ao menos consegue prender nossa atenção. Ao falar sobre questões raciais no auge do Apartheid, onde o racismo era explicito e o genocídio negro estava cada vez pior, movimentos como do trio protagonista foi um grande estopim para uma revolução, temos uma história que merece ser assistida e conhecida. Na busca por liberdade, este filme mostra que a luta começou com um ato relativamente pequeno, se transformou numa revolução e terminou com a esperança de dias melhores, que como a história é conhecida chegaram, mas não antes de grandes sacrifícios terem sido feitos.   

Gostou? Assista ao trailer e comente logo abaixo se já assistiu a este longa.

Fonte: Netflix – Foto com o trio principal e o diretor Mandla Dube

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