“Até a Última Gota” – Crítica

Um dia de fúria e exaustão! O novo filme dirigido por Tyler Perry tem uma boa história, porém é bastante irregular, se segurando apenas pela boa atuação de Taraji P. Henson.

Foto/Reprodução – Netflix

Os filmes produzidos por pessoas pretas têm seu próprio seguimento nos EUA, uma indústria paralela forte que visa beneficiar e atender um público que muitas vezes é ignorado pela indústria hollywoodiana dominada massivamente por pessoas e narrativas brancas. Foi assim que Tyler Perry construiu seu império do entretenimento, atendendo a forte de demanda de comunidades pretas norte-americanas que queriam se ver na telinha e na telona sendo representados.

No final do ano passado, Perry fez um grande sucesso com seu filme de guerra “Batalhão 6888”, uma de suas melhores produções dos últimos anos. Seguindo esta linha, o cineasta estreou no último dia 06 de junho, mais um drama para chamar de seu, “Até a Última Gota” (Tyler Perry’s Straw, 2025), que conta a história de Janiyah Wiltkinson (Taraji P. Henson), mãe batalhadora que tenta dar uma vida melhor para filha pequena e doente, acaba sucumbindo as provações diárias e surtando no processo colocando vidas em risco.

A sinopse tem uma aura de novelão, é porque o filme é exatamente isto. O longa é escrito, produzido e dirigido pelo próprio Tyler Perry para Netflix, seguindo os moldes tradicionais de dramas que já vimos antes, quando somos apresentados a vida de Janiyah e a dificuldade que tem de criar a filha pequena que sofre com convulsões e precisa de medicamentos caros, fazendo com que esta mãe se desdobre em duas para pagar as contas de casa e cuidar da saúde da pequena.

Foto/Reprodução – Netflix

A narrativa não sai muito disto, falta a Perry na maioria dos seus filmes aquele ar cinematográfico que torne a produção única, mas não há como negar que o diretor sabe mostrar bem a história pelo olhar do povo preto dos EUA e não foi à toa que todas suas produções viraram algo cultural por lá, mesmo que não fossem aclamadas pela crítica especializada.

Talvez o maior problema aqui seja o fato de o longa oscilar muito, enquanto no primeiro ato vemos tudo de ruim acontecer com Janiyah seguidamente com apenas 13 minutos de filme, justificando seu surto posterior no assalto ao banco onde a maior parte da ação da trama se passa, temos poucos respiros e muitos diálogos expositivos que as vezes exagera demais na forma como os personagens se expressam.

A verdade é que “Até a Última Gota” funciona bem na sua primeira metade, mas começa a se perder um pouco quando precisa assentar a história em meio a tensão e suspense criados. Falta a Perry criatividade nas saídas narrativas para manter a atenção do expectador, chega em determinado momento que o longa estaciona se perdendo num melodrama até pegar no ritmo de novo perto do final quando consegue o tom certo para trazer o drama psicológico para frente da trama.            

Foto/Reprodução – Netflix

O fato é que a produção só não é descartável, por conta da atuação de Taraji P. Henson (A Cor Púrpura (2023)) no papel principal.  A atriz traz sensibilidade, força e resiliência para uma personagem que comete muito erros e sofre com as circunstâncias de uma pobreza e vida difícil na periferia, mesmo quando o roteiro insiste em transforma-la num estereotipo da mulher preta nervosa, a atriz na maior parte do tempo consegue um bom equilíbrio que nos faz criar empatia imediata por conta da sua humanidade.

Em termos de produção, o filme é daqueles exemplares sem muito brilho e bastante padrão, até mesmo na cinematografia. A direção de Perry é operante, sendo o roteiro a parte mais fraca do todo. Além de Henson, outro destaque do elenco é Teyana Taylor (O Livro de Clarence) no papel da detetive Raymond, que traz humanidade e sororidade feminina preta para a narrativa, evidenciando uma parte bacana do filme que é a forma como é criada uma irmandade entre mulheres pretas que passaram a mesma situação ou algo semelhante que a protagonista.

De uma forma geral, “Até a Última Gota” é um bom filme, longe de ser incrível, ao menos entretém e escancara o abismo social vivido por mulheres pretas na periferia nos EUA atual. Ainda que o filme se torne em alguns momentos exageradamente dramático, a reviravolta final consegue surpreender mesmo que fique muito na cara para os mais atentos.

Foto/Reprodução – Netflix

Ancorado por uma atuação bastante sólida de Taraji P. Henson, o filme não deve ganhar nenhum prêmio, mas consegue trazer temas interessantes que nem mesmo a direção sem inspiração de Perry consegue apagar. Falar de maternidade, negritude na periferia, classe social, racismo estrutural, justiça, dentre outras temáticas sob a visão de uma mulher preta, é poderoso o bastante para prender nossa atenção levando o longa a acertar, ainda que o final abrace a melancolia e a realidade, ao invés da falsa esperança.

Gostou? Veja o trailer abaixo e comente se já assistiu ao longa.

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