“Yasuke” – 1° Temporada – Crítica

Misturando misticismo e lenda, “Yasuke” causa estranheza ao seguir por um caminho mais fantástico e menos calcado na realidade para contar a história do samurai negro no período do Japão feudal.

Fonte: Netflix

Escolhas narrativas fazem parte do exercício de contar uma boa história, é o risco que autor toma para trazer sua visão a vida. Quando as prévias do anime “Yasuke” (2021) foram divulgadas, se esperava algo mais sóbrio e mais focado na lenda do primeiro samurai negro que trabalhava a serviço do lendário Oda Nobunaga durante o período Nanban no século XVI num Japão da era feudal que começava a se abrir mais para vinda de estrangeiros para suas terras devido as constantes negociações comerciais com a Europa e África.

Não que o anime da Netflix não contasse exatamente essa história, ele conta, mas adiciona elementos inesperados para os expectadores que esperavam algo menos mágico e tecnológico, e mais dramático e menos místico. A narrativa criada por LeSean Thomas (Cannon Busters) abre mão desses aspectos para criar sua visão da lenda de Yasuke construindo um universo cheio de seres mágicos, avanços tecnológicos futuristas representado por robôs que tiram um pouco daquilo que muitos de nós buscávamos.

É uma escolha narrativa imprevisível, que fez muita gente torcer o nariz, eu inclusive me peguei questionando o porquê de Thomas e seus roteiristas adotarem esse tom para história. A lenda de Yasuke em si já renderia um anime no maior estilo “Samurai X”, não precisaria de elementos místicos para trazer interesse para história, mas aos poucos entendi que a intenção era criar um universo rico que pudesse gerar várias narrativas sem se limitar aos aspectos históricos do personagem.

Fonte: Netflix

O piloto do anime começa bem contando a história de um período instável no Japão cheio de conflitos e guerra, aqui em “Ronin” (1×01) conhecemos mais da ambientação de época e como a narrativa irá se dividir para contar a história de Eusébio, um escravo negro que estava a serviço de um padre jesuíta, mas que desperta o interesse de Oda Nobunaga, um grande chefe japonês dono de um império que adota esse estrangeiro como protegido e lhe dá a chance de aprender os caminhos para ser um samurai.

Fica nítido que o roteiro escrito por Nick Jones Jr (Casual) tenta mostrar um Yasuke cheio de convicção, passividade e desejos no passado, mas uma figura cheia de culpa e remorso no presente, explorando também como é a vida de uma pessoa negra num território cheio de japoneses que nem sempre aceitavam seu tom de sua pele. Os problemas raciais são uma parte da série, mas tudo aqui é tratado de uma forma um pouco superficial, porque Yasuke por mais que não abaixe a cabeça para as situações e os preconceitos que sofre, não tenta impor respeito através das palavras, mas sim através de ações ganhando a confiança de seus superiores assim como a inveja de seus companheiros e outros que não o enxergam como um igual.

Eu como pessoa preta sinto falta de um pouco mais de atitude do personagem, mas entendendo a passividade dele para com algumas situações. Os episódios “The Old Way” (1×02) e “Mortal Sins” (1×03) mostra muito de Yasuke como pessoa, rapidamente ele cai nas graças de Nobunaga e junto com sua amiga Natsumaru (Ming Na Wen) começam a destacar no exército e nas conquistas territoriais promovidas pelo Clã mostrando habilidades e aptidão para seguir o código dos samurais.

Fonte: Netflix

A narrativa segue uma linha mais clichê nesses episódios, as vezes pesa um pouco na violência (a tortura de Yasuke no episódio 3 é muito desnecessária), mas o anime cresce quando foca mais do passado do personagem explorando sua honra e boa índole. Acredito que depois do impacto visual e dá má impressão que a parte de fantasia tem no piloto, os episódios seguintes começam a te acostumar a este mundo numa narrativa com um tom mais épico trazendo monstros, robôs, mercenários, curandeiros e outros seres peculiares que acabam por cruzar o caminho de samurai e Saki.

A primeira metade da temporada é boa em termos de construção, a segunda metade com os três episódios finais, a série acaba perdendo um pouco de fôlego em termos de história, optando por um caminho mais clichê com uma vilã mais definida, mas sem grandes novidades. A parte boa é que vemos um Yasuke bem mais proativo e focado em proteger essa garotinha que na verdade é mais forte do que se imagina, isso acaba gerando ótimas cenas de ação que acaba por ser o maior trunfo do anime.

Em termos técnicos, “Yasuke” é uma animação muito bem desenhada, com um design arrojado, que senão traz nada de novo, capricha no visual de seus personagens e no visual desse Japão caótico e banhado de batalhas e sangue. Como citei, as cenas de ação são um deleite para quem gosta de animes do gênero, como fica evidente no bom episódio “A Long Road” (1×04) onde vemos o samurai em ação no presente em um de seus melhores momentos.

Fonte: Netflix

As cenas mais agitadas aumentam a temperatura da narrativa exponencialmente, porém a série sofre um pouco para desenvolver seus personagens coadjuvantes, ainda que em alguns momentos consiga cenas emocionantes, como a relação de um robô com sua amiga mercenária no episódio “Pain & Blood” (1×05) onde o anime tenta inserir ganchos e reviravoltas com a crescente ameaça da misteriosa Daimyo e seu exército sobrenatural.

De uma forma geral, “Yasuke” é um bom anime, porém se olharmos apenas um aspecto, pode soar como uma decepção do que poderia ter sido, mas não há como negar que a temporada é envolvente e interessante de assistir, principalmente no quesito ação e visual, onde a narrativa entrega seu melhor, sem falar que o desenvolvimento do samurai negro é outro ponto positivo, com uma aura pacifista, mas com um forte senso de justiça, ele consegue conquistar o expectador, mesmo que as vezes a narrativa insira tanta coisa em seu contexto, que muitas vezes acabe atrapalhando seu protagonismo.

O final da temporada com “Balance” (1×06) traz um final redondinho e possibilidades para o futuro (tem cenas pós créditos), ainda que a escolha de LeSean seja inusitada ao abraçar a fantasia, não há dúvidas estamos diante de um épico medieval, cheio de lutas sangrentas em um mundo cheio de dilemas para um personagem negro que cresce no decorrer dos seis episódios e faz jus a lenda em seu nome, silencioso e protetor, Yasuke mostra que o código de honra dos samurais, pode ser aprendido e passado adiante, não importa a cor da pele, mas índole e o caráter de quem aprende a lição.

Gostou? Veja o trailer abaixo. Se já viu a primeira temporada, comente o que achou.

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