“Mil e Um (2023)” – Crítica

A solidificação do amor através de uma dura realidade! Este longa estreia a coluna “HN Indica” trazendo uma atuação extraordinária de Teyana Taylor numa narrativa envolvente, triste e com um final fora dos padrões no gênero drama.

Foto/Reprodução – “Focus Features”

A realidade urbana é um tema frequente em produções cinematográficas. Quanto mais dura, mais reflete as camadas sociais mais vulneráveis que mostram que temos muito o que aprender em termos de humanidade. Exemplos recentes, como “Até a Última Gota”, o brasileiro “A Melhor Mãe Do Mundo” e até mesmo o longa de Spike Lee (Destacamento Blood), “Luta de Classes”, mostra que para pessoas negras sofrem mais quando estão na base da pirâmide social e nem sempre, conseguem sair de lá sem sequelas.

Abrindo a coluna “HN Indica”, escolhi o longa premiado no Festival de Sundance em 2023, o drama produzido pela Focus Features, “Mil e Um” (A Thousand and One, 2023), dirigido pela cineasta A.V. Rockwell no seu primeiro trabalho em um longa-metragem. O filme conta a história de Inez de La Paz (Teyana Taylor), recentemente saída da prisão, sequestra o filho pequeno Terry (Aaron Kingsley Adetola) do sistema de adoção em que se encontra na busca de uma vida mais estável e pertencimento.

Não existe um cenário fácil para uma narrativa que já começa complicada com Inez tirando Terry do poder do estado e o levando para morar no Harlem em Nova York. Entre todos os erros, a personagem procura constância e acredita que seu filho de seis anos é a forma de conseguir este feito e assim terminar uma trajetória marcada por erros e traumas.

Foto/Reprodução – “Focus Features”

O roteiro também escrito por A.V. Rockwell é bastante cru, conseguindo retratar uma realidade que milhares de norte-americanos em situação de pobreza, advindos de famílias desconjuntadas e suscetíveis a violência dos bairros mais pobres influenciando para que acabem caindo na criminalidade, enfrentam em seu dia-a-dia.

A primeira metade foca bastante em Inez tentando se reerguer e achar um lugar para viver com filho. Ao se passar em 1994, o longa consegue capturar bem o clima dos anos 90 com uma ambientação impecável que acentua o aspecto mais crível da gentrificação dos bairros mais pobres. A direção de Rockwell é bastante sólida focando em pequenos momentos entre Inez e o pequeno Terry que ajuda a criar um elo com público, mesmo que o gênio da mãe seja bastante difícil de gostar.

É neste ponto que “Mil e Um” se torna um drama acima da média, por conta da atuação de Teyana Taylor no papel principal. A atriz que também é cantora na vida real entrega uma atuação complexa, de uma personagem cheia de traumas do passado que no seu jeito bruto tenta demonstrar amor ao filho como forma de conseguir entregar seu melhor.

Foto/Reprodução – “Focus Features”

O filme cresce com Taylor roubando cada cena, mostrando uma mulher preta forte, que por muito tempo viveu a margem da sociedade, foi condenada pelo sistema e mesmo do seu jeito torto, tenta dar um futuro melhor para o filho. Com a atriz em estado de graça, o longa ganha características de estudo de personagem que transita por uma margem cinza, ao invés de concentrar apenas no lado bom ou ruim de sua personalidade.

Por conta disto, a história vai ganhando mais camadas, ainda mais quando a figura paterna de Lucky (Will Catlett) entra em cena com interesse amoroso de Inez e servindo como uma quase figura paterna para Terry. O trio acaba formando uma família aos trancos e barrancos, ainda que a sombra do rapto de Terry ameace essa paz momentânea.

O fato é que “Mil e Um” é daquelas produções que envolvem o espectador é difícil de largar até chegar ao final do terceiro ato. O melhor é que Rockwell não subestima a inteligência do expectador e trabalha o desenvolvimento da história que tem ainda mais dois saltos temporais até chegar em 2005 com Terry já adulto e tendo que lidar com situações inesperadas.

Se o primeiro ato é sobre Inez achando uma forma de viver melhor, a segunda metade expõe que cada ação tem uma consequência, onde a narrativa entrega um dos finais mais chocantes dos últimos anos em termos de reviravolta, mesmo que não seja o que público possa estar esperando.

Foto/Reprodução – “Focus Features”

Por tudo que foi comentado, a estreia da coluna “HN Indica” não poderia começar melhor. O filme “Mil e Um” é simplesmente excelente, com uma produção competente e uma direção sólida, elevado por uma atuação visceral de Teyana Taylor que ainda tem o suporte da boa atuação mirim de Aaron Kingsley Adetola no papel do pequeno Terry, além de Will Catlett no papel de Lucky e Josiah Cross no papel de Terry adulto.  

O longa não cai nas armadilhas do gênero e não se torna melodramático de uma hora para outra pecando pelos exageros. Ao se mostrar mais sóbrio que outros exemplares, este filme é daquelas histórias que te pegam pela sinceridade e te arrebatam pelo choque de realidade. A verdade é que “Mil e Um” te deixará refletindo muito tempo após os créditos subirem. E não há nada mais gratificante, do que uma produção que marca e faz você sair da zona de conforto, neste ponto, o filme acerta muito e quem ganha somos nós.

Gostou? Veja o trailer abaixo e se já assistiu ao filme, comente sobre o que achou.

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