“Jeen-Yuhs: Uma Trilogia de Kanye West” – Análise

Um gigante incompreendido?! O novo documentário da Netflix explora o antes, durante e depois da fama do ícone do rap e hip-hop, Kanye West. Em uma narrativa cercada de gravações e vídeos inéditos, a narrativa busca humanizar uma das figuras mais polêmicas da atualidade.

Fonte: Netflix

Polêmico, insano e gênio. Essas três palavras definem muito a figura de Ye, mais conhecido como Kanye West. O cara é rapper, compositor, diretor e produtor musical, além de ser uma das figuras mais polêmicas e bem sucedidas do show business norte americano, considerado por muito um dos melhores cantores do gênero rap e hip-hop, além de ser um produtor de um prestígio inigualável. Durante os últimos anos, o rapper tem se envolvido em diversas polêmicas, passado por um processo de divórcio doloroso com a milionária Kim Kardastian, além de se mostrar mentalmente instável em várias ocasiões.

Gostando ou não, Kanye West é uma figura icônica, complexa e difícil de entender. Ao mesmo tempo que se envolve em ações controvérsias (o cara chegou ao ponto de apoiar Trump), por outro lado se mostra um artista único, genial e com um dom extraordinário para fazer música através de batidas hipnotizantes e letras ousadas cheias fúria em rimas rápidas onde conseguimos visualizar o verdadeiro talento desse músico para criar arte através de canções que definiram todo um novo estilo de como fazer rap e hip-hop nos EUA dos anos 2000.

Estou falando isso tudo para comentar sobre “Jeen-Yuhs: Uma Trilogia de Kanye West” (Jeen-Yuhs: A Kanye West Trilogy, 2022), um documentário dividido em três partes e que estreou na Netflix dia 16 de fevereiro, sendo lançado desde então um episódio por semana, o último foi exibido no dia 2 de março. Neste documentário, gravado pelo melhor amigo de Kanye, o cineasta Coodie, temos um rico arquivo dos primeiros anos de carreira do cantor até chegar ao estrelato. Assim como o documentário, esta análise se dividirá em três partes.

Ato 1: Visão

“Um gigante se olha no espelho e não vê nada” – Donda West
Fonte: Netflix

Neste primeiro ato do documentário começa rapidamente no final dos anos 90 com Coodie narrando a história da trajetória do amigo que começava a se tornar destaque no cenário da música como produtor musical da gravadora Rock-A-Fella Records, criando batidas e mixagens viciantes para os maiores rappers daquela época, mas sua fama estourou mesmo em 2001 quando compôs os maiores hits do Jay-Z no aclamado álbum “The Blueprint”, a música “Izzo (H.O.V.A.)” colocou o nome Kanye West no radar de muitas gravadoras como o cara que produz sucesso.

O documentário se passa pelo ponto de Coodie, dessa forma ele narra a luta de Kanye West tentar se tornar um grande rapper e não ser conhecido apenas como um produtor de batidas para grandes nomes. Aqui não vemos nada da pessoa que Kanye se tornou hoje, mas ao invés disso vemos um cara talentoso, obstinado e apaixonado pelo que faz tentando se provar dentro de um gênero musical concorrido onde até mesmo as grandes gravadoras não o viam com o talento suficiente para ser rapper, sendo desencorajado por muitas pessoas, ainda assim, nomes como Jay-Z e Mos Def, serviram como inspiração para que ele lutasse para lançar seu primeiro álbum.

 A produção do documentário é simplesmente incrível, as gravações captam momentos íntimos de Kanye, desde sua mudança de Chicago para Nova York, seja seus momentos de trabalho em seu apartamento, rodeado de amigos, seja nos momentos mais familiares, inclusive o ponto alto desse primeiro ato, é a participação de sua mãe Donda West, que não só serviu de inspiração para que continuasse na carreira, mas também a pessoa que definiu o caráter de Kanye West acreditando que ele poderia um dia ser grande.

O legal desta primeira parte de “Jeen-Yuhs” é que percebemos a visão de Coodie em relação ao amigo, enxergando lá na frente o quão grande ele poderia ser, isso se torna basicamente uma jornada para chegar ao topo onde as gravações conseguem trazer uma humanização da figura de Kanye mostrando que não foi fácil conseguir atingir o sucesso que conseguiu hoje.

Ato 2: Propósito

“Eu pensei que era apenas a música. Eu não sabia.” – Pharrell Williams
Fonte: Netflix

Na segunda parte do documentário, a narrativa parece crescer ainda mais quando adentramos os anos de 2002 a 2004, quando a história contada foca na luta de Kanye para lançar seu primeiro álbum, “The College Dropout”, mas tem o sonho interrompido devido a um acidente grave que sofreu e poderia acabar com a sua carreira antes mesmo dela começar. A narrativa aqui ganha uma carga dramática enquanto acompanhamos a jornada de West em tentar lançar seu primeiro single “Through The Wire” que traria o financiamento necessário para lançar seu álbum.

Se o primeiro ato é cercado de luta e poucas glórias, o segundo ato é focado na parte musical e consegue ser ainda melhor. O documentário aqui consegue captar momentos ainda mais sensacionais, com Kanye mostrando suas batidas e suas letras para futuro grandes nomes da música acabando por impressionar produtores e artistas do nível de Pharrell Williams (sim, cantor e produtor do megahit “Happy”) e Jamie Foxx (que inclusive participa da música “Gold Digger”, um dos maiores sucesso da carreira de Kanye West), sem falar que testemunhamos West participando da turnê do Jay-Z onde podemos ver nos corredores do pré-show rostos familiares como o de Beyoncé.

O acidente que quase tirou a carreira de Kanye serviu como propósito para que o mesmo se inspirasse criando vários hits, é incrível assistir a concepção e os bastidores de “Through The Wire”, “Jesus Walks” e “Gold Digger”, se você viveu essa década, você sabe o significado dessas que músicas praticamente definiram um gênero e uma geração, para quem gosta de rap e hip-hop é puro deleite. A reação dos amigos e familiares a genialidade de Kanye West é evidente, sua obstinação, fé e capacidade de criar música mesmo em seus piores momentos torna essa segunda parte simplesmente inspiradora.

Ato 3: Despertar

“As respostas sempre estão aí, quando tiramos tempo para contempla-las e ouvi-las através dos anjos colocados em nossas vidas” – Coodie
Fonte: Netflix

A última parte do documentário, talvez a que amarre melhor narrativamente as ideias e o objetivo das gravações de Coodie, e talvez seja a que mais dói também, pois abrange muitos aspectos da vida de Kanye West que fez o cantor se perder durante o tempo. É triste perceber que o divisor de água para desencadear os problemas mentais de Kanye foi exatamente no período que a mãe faleceu.

Donda foi o cerne de “Jeen-Yuhs” e a força motriz que deu forças para Kanye atingir seu potencial, algo que seu melhor amigo Coodie sempre percebeu. Os primeiros minutos da parte 3 focam exatamente na consolidação de Kanye como artista e prestes a lançar o terceiro álbum entre 2006 e 2007. Donda virou uma grande empresária e filantropa, apoiando ainda mais o filho na carreira, a sequência que ele canta “Hey Mama” com ela é simplesmente maravilhoso. Sua morte no final de 2007 foi o estopim para ver um Kanye que só víamos vestígios, mas que sempre esteve ali.

A segunda metade da parte 3 surpreende por mostrar não só Kanye como uma figura com toque de Midas, mas também uma pessoa que falava o que pensava sem nenhum freio. Isso o afastou dos amigos de infância, fez dele uma pessoa um pouco antipática e as diversas polêmicas que seguiram, acabou por sobrepor sua genialidade como cantor, rapper e compositor.

Fonte: Netflix

Ainda assim, o documentário consegue achar algumas gravações surpreendentes e é notável como Coodie é respeitoso em proteger o amigo nos piores momentos vendo que psicologicamente ele não está bem. Esta última parte continua trazendo boas participações, como Justin Bieber, Kid Cudi, mas não expõe muito a família de Kanye, como seus filhos com Kim e até mesmo a vida dele com a socialite.

O nome “Despertar” é exatamente em referência a amizade de Coodie e Kanye, que ficou abalada, passou por altos e baixos, mas o primeiro viu que precisava dar esse apoio e finalizar este trabalho para o amigo, mostrando que por traz de todas as polêmicas e frases exageradas, ainda mora um lado gênio com veia empreendedora e ainda musical na mente de West, servindo como válvula motivadora para seu amigo continuar buscando o verdadeiro Kanye dentro do próprio Kanye.

Veredito

“Jeen-Yuhs vale a pena?”
Fonte: Netflix

No geral, esta trilogia “Jeen-Yuhs” sobre a trajetória de sucesso de Kanye West, é basicamente uma carta de amor a amizade de Coodie e Kanye, onde vemos um cantor que teve um início difícil, mas que conseguiu um sucesso inimaginável se consolidando como um dos melhores cantores de todos os tempos nos EUA. Com uma produção caprichada e uma edição esperta, Coodie Simmons e Chike Ozah conseguiram filtrar o essencial que captura exatamente quem é Kanye e como a morte de sua mãe Donda West foi o divisor de água em sua vida. Um documentário feito para fãs e não fãs, que realmente traz momentos íntimos onde conhecemos melhor a complexidade de Kanye, gênio na música, pessoa de boa índole, que infelizmente se perdeu no auge da fama.

O final do documentário traz um tom esperançoso na narração de Coodie, que vê Kanye um dia saindo do poço e transcendendo, neste ponto ele sabe que a fé em Deus é parte do caminho, mas a jornada de Kanye, só ele mesmo poderá descobrir a si mesmo novamente de formar melhorar, pois apenas Kanye entende Kanye, somente um gigante pode tentar ver a si mesmo num complexo espelho de ilusões. 

Gostou? Veja o trailer abaixo, ou comente se já assistiu a este ótimo documentário.

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