Longos monólogos, uma grande DR, um casal em crise em um longa de altos e baixos que só se segura pelas qualidades técnicas e as boas performances de John David Washington e Zendaya.

Filmes com apenas dois protagonistas não é uma novidade no cinema, normalmente é onde você vê o potencial de um ator, quando ele tem bastante de tempo de tela para si para mostrar sua versatilidade e grau de atuação, e se sua química com o parceiro é boa, aí que a história empolga e se torna ainda mais atraente, afinal tramas assim estão ligadas de uma forma bastante intimista onde a direção privilegia diálogos e uma câmera mais estática ajuda a criar uma atmosfera mais imersiva.
Todas essas qualidades são a base do drama de romance da Netflix escrito e dirigido pelo cineasta Sam Levinson (Euphoria) que conta a história do diretor Malcolm (John David Washington) e sua namorada Marie (Zendaya) que vê seu relacionamento ser testado depois de retornar para casa após a premiere de seu filme e enfrentar alguns conflitos e brigas durante uma longa noite.
O filme “Malcolm & Marie” (2021) é um indie drama, feito durante a pandemia de forma secreta e seguindo todos os protocolos segundo o diretor, com uma equipe mínima e tendo apenas dois atores no elenco, o longa logo virou um dos filmes mais aguardados de 2021 principalmente depois de ser adquirido pela Netflix estreando no mês de fevereiro. A narrativa é bastante contida e como citei, explora uma atmosfera mais intimista, mas cheia de estilo que se passa apenas em um local que é a casa do casal.
Talvez uma das dificuldades de “Malcolm & Marie” seja se estabelecer como obra cinematográfica, mais na questão de roteiro, que muito lembra o de uma peça de teatro, com diálogos super longos, conversas intermináveis que vão transitando de um personagem para outro carregado de emoções à medida que os conflitos vão abrindo feridas numa relação que se mostra ao mesmo tempo desgastada e avassaladora no bom e no mal sentido se é que isso seja uma forma de se analisar a situação.

O filme tenta se dividir em atos, mas parece apenas algo que não se quebra dessa forma, tornando tudo linear demais sem muitas reviravoltas que indiquem uma transição de sua primeira para sua segunda metade, mas existe algo peculiar na direção de Sam Levinson que consegue dar um ritmo na dinâmica do casal que se intercala num protagonismo onde cada um expõe seus questionamentos, isso faz com que a narrativa consiga momentos de pura emoção e tensão, intercalados com momentos amor e paixão de duas pessoas que se conhecem bem, que se amam, mas que se tornaram um peso um para o outro.
Relacionamentos são complicados e complexos, neste filme tudo é ainda mais amplificado, uma vez que o roteiro de Levinson traz bons assuntos principalmente relacionados ao cinema para serem quebrados em diálogos e argumentações que vão desde crítica ao cinema moderno, passando pela crítica ao cinema arte, até chegar numa crítica ácida aos próprios críticos de cinema e sua avaliação de uma obra que as vezes nem são aquilo que o cineasta em questão imaginou. Isso tudo funciona como um pano de fundo para explicitar a própria personalidade do diretor e como sua namorada enxerga tudo aquilo, levando exatamente nas discussões de relação que ajudam a deixar o filme mais interessante.
É claro que “Malcolm & Marie” é também sobre a relação de um casal negro, porém o fato do diretor ser branco, ele acaba não entrando muito nesta questão ou se arriscando muito nesta questão, mas ao menos consegue capturar todos os entraves que isso ocasiona, principalmente em relação as obras de Malcolm que tenta trazer sempre um contexto racial para suas obras, tendo Marie como sua maior crítica e uma das poucas que consegue enxergar suas qualidades, defeitos e seus enigmas narrativos.

Muito do que faz este filme algo a ser apreciado, é a forma como a direção consegue um equilíbrio perfeito entre design de produção (impecável), fotografia (lindíssimas) e atuações, tudo aqui é muito bem filmado, o fato da obra ser preto-e-branco dá ainda mais personalidade e qualidade técnica a obra, funcionando como deleite visual para quem é fã de cinema e mostrando o apreço de Sam Levinson pela qualidade cinematográfica como forma de contar uma história.
Eu citei as atuações, muito do que faz a narrativa funcionar são elas, John David Washington (Tenet) na pele de Malcolm, entrega o papel de um homem charmoso, mas muito egocêntrico e que não aceita críticas fáceis e simples as suas obras, e vê Marie como sua musa inspiradora, mas também aquela que mais vê seus pontos fracos e vulnerabilidades, aqui Washington atua até bem, apesar de no começo o ator sofrer um pouco para achar o tom correto de seu personagem. Por outro lado, Zendaya (Homem Aranha – Longe de Casa) entrega uma atuação estupenda, ainda que não seja fácil vê-la com a idade que sua personagem parece ter (ela parece um pouco nova para o papel), isso dissipa quando a atriz entrega uma performance cheia de emoção, vulnerabilidade e força que encontra seu ápice no fantástico monólogo perto do final, simplesmente incrível como a atriz evoluiu na carreira em tão pouco tempo mostrando uma maturidade como poucas da sua geração.
De uma forma geral, “Malcolm & Marie” é um bom drama, gosto como a narrativa consegue equilibrar um ritmo mais lento, com um ritmo mais acelerado de acordo com os conflitos e discussões do casal, as vezes sinto falta de uma trilha sonora mais envolvente, mas ainda assim o longa tem muito charme e uma parte técnica que salta os olhos. É claro que o longa não é livre de defeitos, mas no geral é um drama forte, com diálogos bem escritos e ainda que tenha um texto que se encaixe melhor em peças de teatro, a trama ainda encontra momentos de pura emoção, sensualidade e charme que vale cada segundo do tempo investido nele, intercalando um romance e drama de uma forma bastante intensa, catapultado por duas boas atuações que exalam química em tela e que eventualmente farão amantes do gênero revistar este drama de tempos em tempos.
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3 comentários sobre ““Malcolm & Marie” – Crítica”