“Cidade De Deus” – Crítica

O melhor do cinema nacional! Indicado a 4 Oscars, um dos longas mais aclamados de todos os tempos ganha revisão na coluna “Nostalgia Preta” apresentando uma crônica urbana sobre negritude, periferia, violência urbana e nascimento das favelas cariocas num thriller espetacular e eletrizante.

Fonte: O2 Filmes e Globo Filmes

O ano era 2002 quando o longa “Cidade de Deus” estreou causando um impacto primeiro em Cannes, depois no Brasil, conquistando o resto do mundo no processo. O longa que foi indicado ao Oscars 2004 em quatro categorias incluindo melhor edição e melhor direção depois de ser ignorado erroneamente em 2003 pela Academia, numa das repercussões negativas mais polêmicas da década dos anos 2000.

Ao revisar este prestigiado filme nacional produzido pela O2 Filmes, Globo Filmes e Vídeo Filmes, me peguei pensando o quanto a narrativa escrita por Bráulio Mantovani numa adaptação da obra de Paulo Lins de mesmo nome que conta um pouco do surgimento das favelas e do crime organizado no processo em um dos maiores complexos habitacionais do Rio de Janeiro. Se passando pelo ponto de vista de Buscapé (Alexandre Rodrigues), um garoto que sonha em ser jornalista, a trama é uma crônica urbana se passada em três fases durante as décadas de 60 e 70 que conta também a saga do criminoso mais famoso do lugar, Zé Pequeno (Leandro Firmino).

É com essa premissa que a obra toma forma e embarcamos numa narrativa que surpreende principalmente pela forma como é contada. Existe quatro pontos que tornam o longa simplesmente incrível, primeiro é o roteiro que tem muitos personagens, mas ainda assim consegue desenvolver a maioria deles da forma correta não só em termos culturais, mas em termos sociais em uma história que é muito bem ambientada.

Fonte: O2 Filmes e Globo Filmes

O segundo ponto é a edição, Daniel Rezende não só criou umas das montagens mais brilhantes da história do cinema, como ajudou a dar um dinamismo muito grande para um longa que consegue transitar entre épocas em um vai vem narrativo que não fica confuso, mas deixa a história ainda melhor, quando vemos o surgimento de Dadinho (Douglas Silva) na sombra dos bandidos famosos da favela chamado Trio Ternura que fazem parte do primeiro arco da narrativa.

É desta forma que “Cidade de Deus” se destaca dentro da história do cinema brasileiro, sua capacidade de contar uma boa história de uma forma única com personalidade que chega exatamente no terceiro ponto, a direção de Fernando Meirelles (Ensaio de Uma Cegueira), que une a edição inteligente de Rezende, o roteiro excelente de Braulio e a bela fotografia de César Charlone, entregando momentos memoráveis a começar pela excelente abertura com a câmera acompanhando a perseguição a uma galinha no meio da favela, passando pela transição de Dadinho se tornando Zé Pequeno (Leandro Firmino), até a guerra do tráfico no último ato do filme.

O quarto ponto que faz a obra tão aclamada, é o elenco que mistura em sua maioria atores amadores em seus primeiros papéis, com alguns veteranos. Alexandre Rodrigues, Leandro Firmino, Seu Jorge, os irmãos Phellipe Haagensen e Jonathan Haagensen, Roberta Rodrigues, Matheus Nachtergaele, Michel Gomes, Alice Braga, Douglas Silva, Darlan Cunha formam nomes pouco conhecidos até então, mas que entregaram trabalhos sólidos e marcantes que misturam carisma e puro talento, impossível assistir ao longa e não lembrar de ao menos um personagem ou frase icônica interpretado e mencionado pelos nomes citados.

Fonte: O2 Filmes e Globo Filmes

Através destas qualidades, é que “Cidade de Deus” sintetiza o cinema brasileiro de qualidade que conquistou não só brasileiros no começo dos anos 2000, mas também vários gringos pelo resto do mundo sendo lembrada até hoje como uma das melhores obras que o áudio visual já produziu. Não só pela forma como o filme é culturalmente rico, mas também por mostrar a construção da periferia da comunidade Cidade de Deus desde seu começo, mostrando personagens que transitam entre bem e mal, com vários personagens cinzas e complexos, mostrando a realidade da favela sem romantização, mas também humanizando pessoas que viviam no local, mesmo cercados de perigos e violência.

Em termos técnicos, podemos destacar ainda a trilha sonora cheia de canções e acordes bem executados que capturam os anos 60 e 70 do Rio de Janeiro muito bem, somado aos bons figurinos e a direção de arte impecável. Outro destaque é que o longa envelheceu bem, claramente vemos um filme que retrata a realidade brasileira de uma forma emocional, mesmo que tenha seus momentos de crueza. A trama atravessa épocas, muitas coisas podem ser tiradas do filme e colocados no contexto atual que ainda geram bons debates sobre segurança pública e sobre o tratamento dado as comunidades cariocas.

De uma forma geral, “Cidade de Deus” é um grande filme, não só por ser uma narrativa muito bem contada e dirigida, mas por ser o Brasil representado da forma mais realista possível baseando-se numa história verídica que teve a imensa sorte de ser muito bem adaptada com o maior apuro técnico e cinematográfico possível. É o Brasil da negritude exalando na periferia mostrando pessoas humildes sobrevivendo, lados sendo tomados e vidas sendo traçadas em meio ao surgimento de uma comunidade. A história de Zé Pequeno, Buscapé, Mané Galinha e outros que mostra a potência do cinema nacional num longa monumental e inesquecível, mesmo após 22 anos de existência.

Disponível para Assistir: Globoplay, Netflix, Prime Video e Max.

Gostou? Veja o trailer abaixo e comente sobre que acha do filme.

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