“Pantera Negra: Wakanda Para Sempre” – Crítica

Um dos melhores filmes da fase 4 da Marvel é um caldeirão de emoções, não é livre de defeitos, mas ainda assim consegue fazer um belo tributo a Chadwick Boseman e apresentar a nova Pantera Negra de forma justa e simbólica em meio a uma nova ameaça.

5 Indicadções ao Oscar 2023
Vencedor de um oscar
Melhor Figurino

O luto existe em vários estágios e só pode ser sentido aos poucos e à medida que o tempo passa, é quando processamos o ocorrido e percebemos que aquela pessoa que amamos não vai voltar. O falecimento de Chadwick Boseman em agosto de 2020, chocou o mundo pela forma repentina, mais ainda após descobrirmos que o ator estava anos lutando incessantemente contra um câncer enquanto gravava seus filmes, mostrando ainda mais a força de uma pessoa que não se dava por vencido sempre mantendo o otimismo e um sorriso marcante no rosto enquanto se tratava em segredo.

A grande pergunta que ficou, foi como o diretor Ryan Coogler (Pantera Negra) iria fazer para continuar o legado de T’Chala que encantou plateias mundo a fora através de uma interpretação única de Boseman tornando o personagem insubstituível. O roteiro de “Pantera Negra: Wakanda Para Sempre” (Black Panther: Wakanda Forever, 2022) estava pronto, preste a filmar e teve que ser reescrito do zero, isto sem falar que a curiosidade de todos sobre o destino do super-herói criava uma expectativa enorme de como a Marvel Studios tocaria o barco a partir daquele momento.

Então chegamos à estreia da sequência mais esperada da fase 4 e talvez a mais importante da trajetória do Universo Marvel até o momento, após muito sigilo com poucas informações soltadas para o público, o longa estreou no dia 10 de novembro aqui no Brasil. Esta sequência se passa depois os eventos de “Vingadores: Ultimato” e mostra Wakanda após se revelar para o mundo lidando com uma grande tragédia para seu povo que pode colocar em risco suas relações diplomáticas com resto dos países estrangeiros, tudo isso se intensifica quando uma nova ameaça surge das profundezas do oceano.

Tudo que você precisa saber sobre “Pantera Negra: Wakanda Para Sempre” é que a trama é a de um filme de guerra político com uma nação ferida tendo que se proteger em meio ao luto, mas que ainda guarda momentos para ser um filme de super-herói. A partir do momento que você entender as intenções de Ryan Coogler, a narrativa começa a ficar mais clara te preparando para imergir numa experiência diferente daquilo que você está acostumado assistir.

O grande trunfo do filme anterior, era o equilíbrio entre sua poderosa história de sucessão real e o legado de um super-herói em construção. Esta sequência escrita pelo próprio Coogler e novamente por Joe Robert Cole (Dias Sem Fim), não consegue o mesmo resultado por apresentar uma fragilidade na escrita que intercala momentos de pura emoção, com diálogos ricos e poderosos sobre a dor da perda, com outros onde a história é simplificada para fazer a trama se movimentar tornando tudo previsível e pouco inspirado.

Todas as sequências que prestam na homenagem a Chadwick Boseman e seu personagem T’Chala, são bem-feitas a começar pela abertura a frio (a famosa cold open) até aparecer o símbolo da Marvel, além de outra cena lindíssima perto do final que vai fazer até mesmo o fã mais crítico se emocionar. É ali que está a aura de “Wakanda Para Sempre”, o coração pulsante de uma narrativa que ainda está lidando com a dor da perda e precisa fazer essa transição enquanto tenta seguir em frente.

O primeiro ato é fortíssimo, bastante focado na relação de Shuri (Letitia Wright) e Ramona (Angela Bassett) lidando com ausência do rei e como a rainha se utiliza dos preceitos africanos de ancestralidade que a morte é apenas uma passagem para tentar fazer a filha amenizar sua dor interior, através disto o filme consegue nos envolver de tal forma que só fica melhor com a introdução de seres misteriosos vindo das profundezas liderados pelo intimidador e eloquente Namor (Tenoch Huerta), que busca proteger seu território das ameaças dos estrangeiros que procuram vibranium e vê em Wakanda um meio para lutar contra os seres da superfície.

Sem dar spoilers para não estragar as surpresas, digamos que a introdução da jovem Riri Williams (Dominique Thorne) na narrativa é o estopim para um conflito que pode levar a uma guerra entre Wakanda e o povo de Talocan. É neste ponto que Coogler mostra como sua narrativa é um enxerto quebradiço, certas motivações são bem desenvolvidas principalmente do vilão principal mais uma vez introduzido de uma forma exemplar graças a uma atuação bastante sólida do ator Tenoch Huerta, porém todo o conflito que parece levar a uma eminente guerra carece de motivos mais significativos, que aqui infelizmente se perdem quando o filme prefere usar meios mais fáceis para atingir seus objetivos.

É claro que esse conflito entre essas duas nações é uma adaptação de algo que já aconteceu nos quadrinhos, portanto bastante aguardada para quem já leu sobre esse conflito, mas sua versão em live action tem diversas camadas ao mudar a origem de Namor para não coincidir com Aquaman super-herói da empresa rival, trazendo a cultura latina ligada aos povos pré-colombianos trazendo uma riqueza bem-vinda para um personagem conhecido por ser um implacável anti-herói.

A verdade é que tudo envolvendo o príncipe de Talocan, seus aliados Attuma (Alex Livinalli) e Namora (Mabel Cadena), e todo o reino aquático é um deleite narrativo e visual, bem desenvolvido, muito bem dosado dentro da história e que deixará muita gente pedindo um filme solo do personagem após o término do longa.

Por outro lado, e talvez o ponto mais importante para você que vai assistir “Pantera Negra: Wakanda Para Sempre”, é saber que este filme é das mulheres de Wakanda, se no primeiro filme elas foram brilhantemente introduzidas e bem desenvolvidas, aqui todas assumem um bem vindo protagonismo liderado por Shuri, Ramona, Nakia (Lupita Nyong’o) e Okoye (Danai Gurira), é delas as melhores cenas de ação, é delas os melhores diálogos, é delas a vontade fazer esta história acontecer.

Mais uma vez “Pantera Negra 2” mostra a força do seu elenco negro que entrega tudo e mais um pouco, Angela Bassett de longe é a melhor personagem do filme, com uma carga dramática que anseia por espaço e entrega tudo aquilo que se espera de uma grande atriz (excelente), podemos esperar vê-la crescendo na temporada das indicações. Danai Gurira (The Walking Dead) como sempre entrega na ação e no carisma fazendo milagres com sua ótima Okoye, uma personagem que merecia um arco melhor definido, mas que claramente está sendo preparado para algo mais no futuro.

A atriz Lupita Nyong’o (Nós) retorna no papel de Nakia exalando beleza, trazendo leveza e inteligência para uma personagem que clama por mais desenvolvimento dentro da narrativa. Dominique Thorne (Judas e o Messias Negro) é puro carisma e o alívio cômico ideal no papel de Riri Williams, uma mistura de Tony Stark seguindo a vibe de personagens como Peter Parker e Kamala Khan, trazendo um pouco de humor para uma narrativa que na maior parte do seu tempo é bastante séria.

E por último, mas não menos importante Letitia Wright no papel de Shuri, a atriz tinha uma missão complicada, e na primeira metade claramente ela sente um pouco esse peso, mas a meu ver evolui bastante até o final, polêmicas à parte, Wright é decente com a oportunidade de ser grande no futuro, a sequência final do longa é seu melhor momento. Ainda falando do elenco, vale uma menção mais que merecida para Winston Duke no papel de M’Baku, o ator é ótimo e tem presença, toda vez que entra em cena, rouba a atenção para si.

Em termos de produção, “Pantera Negra: Wakanda Para Sempre” tem uma trilha sonora impecável, que nem sempre é utilizada da forma correta em determinados momentos, mas todo estilo tribal, todo estilo africano misturado com hip hop e pop moderno é utilizado para dar estilo e personalidade a filme que ainda pulsa cultura e entrega mais ainda na fotografia, as cenas aquáticas e externas de Wakanda são belíssimas e dão um escopo grandioso a narrativa.

Outro ponto interessante é como Ruth E. Carter consegue trazer o afro futurismo como peça de evolução para seus figurinos deixando seus personagens mais ricos em estética ainda que visualmente estranho inicialmente, em outros momentos ela mantêm o que deu certo neste quesito no filme original, desta forma toda a elegância das vestimentas afro ainda permanece. A direção de arte continua impecável quando consegue misturar duas culturas tão ricas como Wakanda e Talocan, os efeitos visuais estão ótimos e ajudam a dar uma grandiosidade para um universo que só enriquece à medida que a trama avança.

Juntando todas essas qualidades e algumas ressalvas, “Pantera Negra: Wakanda Para Sempre” é um ótimo filme, talvez passe a sensação de que falta algo na narrativa devido à grande ausência de Boseman, mas Coogler conseguiu fazer o que podia ao equilibrar a homenagem e a trama que queria contar num filme que tem peso e luta para deixar sua marca mesmo que o roteiro insista em querer torna-lo comum em meio a anseios por conexões gratuitas, easter eggs e diversos arcos em aberto que irão alimentar outras histórias.

No geral, esta obra talvez não supere o monumental primeiro filme e nem precisa, afinal estamos lidando aqui com uma grande perda, mas também a esperança da semente da continuação de um legado. “Wakanda Para Sempre” tem a grandiosidade de um blockbuster (o terceiro ato é magnífico), mas o sentimento de um filme menor e mais íntimo que toca aqueles que abraçaram esse universo e esses personagens, mesmo não sendo perfeito, o longa consegue empolgar ao introduzir um novo mundo, surpreender e chocar em reviravoltas inesperadas, prender nossa atenção mesmo sendo longo e ainda introduzindo a nova Pantera Negra que irá ser espelho para próximas gerações numa trajetória que ainda precisa ser moldada, mas que possivelmente seguirá a trajetória do seu antecessor, este que infelizmente se foi, mas felizmente vive e viverá em nossos corações para sempre.

Observação 1: Prepare o coração para uma linda cena no meio dos créditos.

Observação 2: A música “Lift Me Up” da Rihanna é simplesmente incrível e dá um tom de alento e melancolia perfeita para o legado deixado por Chadwick Boseman.

Gostou? Veja o trailer e comente abaixo sobre o que achou do longa.